Mesa Completa - Por Solange Souza

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    Colunistas • 24 de maio de 2018

    Cozinheiras da vida

    A criatividade é o que move cozinheiras habituadas com a escassez, como Ieda Matos, destaque desta coluna – Chef Carlos Ribeiro

    A cozinha sempre nos traz histórias para contar. Através dela, temos muitos pedaços, recortes, e ontem foi um dia de ouvir muita coisa nova, que me foram ditas de outras formas. Ouvi da jovem cozinheira Mirna Gomes: “Como é bom estar entre os nossos”. Logo depois, fui sentindo que é exatamente o que estamos fazendo aqui nesta vida, na vida de cozinheiros, aprendendo com os mais experientes como Ana Rita Suassuna, para quem a criatividade é imprescindível na cozinha artesanal do semiárido em tempos de seca. Ambas, Ana Rita e Mirna, me levaram para o caminho de Ieda Matos, que coloca suas origens e sua alma na cozinha da Chapada Diamantina.

    Começamos nossa conversa num café com prosa, e fiquei cheio de palavras novas de uma experiente cozinheira da vida, que aprendeu a cozinhar com o que tinha. “A fome não espera a fruta amadurecer, a fome não espera nada”, disse ela. Bem sábio tudo isso, pois quem viveu em lugares de muita escassez cozinha com o que tem e come o que tem. Nem pensamos duas vezes quando olhamos aquela comida abençoada em nossa frente e sequer perdemos tempo perguntando: será que vou gostar?

    A força da palavra é nosso maior tesouro e com a palavra transformamos nossas vidas e nossa cozinha

    A coluna de hoje vem justamente da riqueza da oralidade, do conjunto e do jogo de palavras que nos une e nos fortalece, traduzindo nossa comida e nossa cozinha. E da mesma Ieda fui ouvindo outros relatos muito semelhante aos de outros cozinheiros que aprenderam o ofício por um outro caminho, que é o da fome e de pouca comida. Enquanto tomávamos um café, ela me descrevia seu vocabulário: “os cortados é como chamamos tudo que usamos cortados dos nossos ingredientes. Vocês aqui chamam de picar, nós chamamos de cortados, não é lindo?”

    E assim fui me envolvendo com a comida que sempre foi feita com o que tínhamos em poucos ingredientes e muita variedade no modo de fazer. E o que nos fica de riqueza de tudo isso? As experiências que adquirimos em nossas andanças. Uma delas, foi um aprendizado com Dona Nena, uma senhora de Mucugê, que me disse: “Sirva a comida que você come. As mesmas comidas que eu dou para os meus bichos, eu como”. Olhe que força tem todas essas palavras, que ouvimos das pessoas que cozinham porque gostam de verdade, fazendo comida quase sempre sem muitos recursos, comida boa, aproveitando cada ingrediente que está disponível no seu entorno. Com base em todos esses recortes que a vida trouxe, Ieda também buscou o conhecimento estudando gastronomia no banco de escola. E hoje, temos uma cozinha da Chapada Diamantina cravada no coração do bairro de Pinheiros, com um cardápio pequeno, mas de uma riqueza ímpar, com sabor de quem cuida da comida que faz.

    Entre muitos dos seus quitutes estão o Bolinho de Estudante, feito na hora, finalizado com açúcar e canela. Ela também faz sua versão salgada, acompanhada de pimentas, molho lambão e geleias que ela mesma produz. Um salto maravilhoso está em seu Baião de Dois, mas o forte mesmo fica para o Godó, uma comida feita com banana mas que pode ser feita de diversas maneiras, com ou sem carne. Vale a pena cada garfada.

    Podemos encontrar um menu fixo, mas também podemos ser surpreendidos com outros tesouros da memória dessa cozinheira. Então, melhor sempre ficar atento e podemos ter o prazer de provar o Arroz de Poço e o Arroz de Garimpeiro, entre tantas delícias da cozinha brasileira. E que bom que nos últimos 10 anos a comida brasileira tem conquistado seu espaço graças a pessoas que cozinham e que nos trazem com muito orgulho sua cozinha de origem.

    A homenagem de hoje vai para: Ana Rita Suassuna, Mirna Gomes, Dona Nena e Ieda Matos.

    Godó de Banana

    Ingredientes

    • 2 dúzias de bananas nanicas
    • 1 cebola média picada
    • 2 dentes de alho picados
    • 1 tomate picado
    • 2 colheres (sopa) de óleo
    • sal a gosto

    1. Descasque as bananas, corte-as em cubos e coloque na água para que não fiquem escuras.
    2. Em uma panela, coloque o óleo e deixe aquecer. Junte a cebola, alho e o sal e vá refogando até dourar tudo.
    3. Acrescente o tomate e a banana, cubra com água, tampe a panela e deixe cozinhando até que as bananas fiquem bem macias e cozidas.

    Dicas: caso queira fazer com carne de sol, é só fritar a carne com os ingredientes acima citados ou também pode colocar a banana com a carne e deixar cozinhar tudo junto. Sirva com arroz vermelho, salada e quiabo grelhado ou refogado ou com o que tiver disponível).

    Casa de Ieda
    Rua Ferreira de Araújo, 841 – Pinheiros, São Paulo – SP
    De terça a sábado, das 12 às 15h
    (11) 4323-9158

    carlosribeiro

    Na Cozinha Restaurante e Escola de Culinária
    Rua Haddock Lobo, 955 – Jardins
    Telefones: (11) 3063-5377 e 3063-5374


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